No final de 2024, a EMA (Agência Europeia de Medicamentos) promoveu uma consulta pública sobre sua política para lidar com os conflitos de interesses dos especialistas que convoca para participar de diversas atividades da Agência. A EMA há muito tempo falha na gestão de conflitos de interesses (1).
Graças, em especial, ao trabalho do Fórum de Medicamentos na Europa, cofundado pela Prescrire, o regulamento europeu de 2004 que criou a EMA exigia que ela publicasse quaisquer conflitos de interesses de seu quadro de funcionários e dos especialistas que pudessem “prejudicar sua independência” (2).
Após dois anos e uma queixa da Formindep (uma organização francesa sem fins lucrativos que defende a informação médica independente) ao Provedor de Justiça Europeu, foram finalmente publicados os resultados de uma auditoria da Comissão Europeia de 2009, que revelou muitos casos em que a EMA não conseguiu fazer valer as suas próprias regras: havia omissões de informações nos formulários de declaração de conflitos de interesses, havia chefes de equipe de produtos que haviam trabalhado recentemente com as farmacêuticas que fabricavam os produtos que agora supervisionavam, etc. (3). Essa auditoria foi uma das razões pelas quais o Parlamento Europeu se recusou a aprovar a gestão dos orçamentos da EMA para 2009 e 2010 (2-4).
Em 2012, em resposta à pressão do Parlamento, a EMA reforçou sua política para lidar com conflitos de interesse. Posteriormente, ela a flexibilizou: em 2014, por exemplo, reduziu (e, em alguns casos, eliminou) o período de “quarentena” de três a cinco anos durante o qual os principais formadores de opinião que haviam recebido pagamentos de empresas farmacêuticas ficavam excluídos de cargos de responsabilidade, como a direção de um comitê científico (2).
Neste último caso, após uma década sem agir, a EMA levou poucos meses para propor regras mais rígidas para lidar com conflitos de interesses. Desta vez, o impulso veio da indústria farmacêutica e seu uso dos conflitos de interesses dos especialistas para atingir seus próprios objetivos (1, 5).
A nova versão preliminar da política, publicada para consulta pública em outubro de 2024, surgiu depois que um tribunal europeu anulou (em março e junho de 2024) duas recusas de autorizações de comercialização, a pedido das farmacêuticas afetadas (1). As empresas alegaram que os especialistas convocados pela EMA tinham conflitos de interesses com uma empresa rival (5).
A nova política da EMA, adotada em dezembro de 2024, exige, entre outras coisas, que os especialistas que tenham participado como investigadores em um ensaio clínico de um medicamento não se envolvam em atividades da EMA relacionadas à mesma doença por pelo menos três anos. No entanto, eles podem ser convocados como “testemunhas especialistas” (6).
Na resposta da Prescrire à consulta, nos opusemos particularmente à insinuação da EMA de que a necessidade de assessoria científica de alto nível é incompatível com a imparcialidade e independência dos especialistas [1, 7]. Como se a EMA acreditasse no mito de que interesses conflitantes comprovam a competência de uma pessoa.
Referências