A empresa farmacêutica Orexigen Therapeutics falhou em cumprir sua obrigação de realizar um ensaio pós-autorização para avaliar os efeitos adversos cardiovasculares de longo prazo da combinação de dose fixa de bupropiona + naltrexona (Mysimba°), autorizada na União Europeia para uso em pacientes com obesidade ou com excesso de peso. Agora, 9 anos após sua autorização, a Comissão Europeia solicitou à Agência Europeia de Medicamentos que revisse sua relação de danos e benefícios.
A naltrexona é um antagonista dos receptores opióides, e a bupropiona (anteriormente conhecida como amfebutamona) é um inibidor da recaptação de noradrenalina e dopamina. A bupropiona tem uma estrutura química semelhante à de certas anfetaminas (1). Desde 2015, a combinação de bupropiona + naltrexona (Mysimba°) está autorizada na União Europeia para adultos com obesidade ou com excesso de peso. Ela é comercializada em alguns países europeus, incluindo a Bélgica, mas não na França. Tem uma eficácia modesta na perda de peso, mas não demonstrou ser eficaz contra as complicações clínicas da obesidade (1-3). A combinação de bupropiona + naltrexona está entre os medicamentos a serem evitados pela Prescrire desde 2017 devido a seus efeitos adversos desproporcionais, em particular transtornos cardiovasculares e neuropsiquiátricos (incluindo convulsões) (4).
Quando a Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA) aprovou a combinação de bupropiona + naltrexona em 2014, foi com a condição de que a empresa farmacêutica Orexigen Therapeutics realizasse um ensaio de 4 anos para avaliar os efeitos cardiovasculares adversos de longo prazo do medicamento. Essa obrigação foi provocada pelos dados dos ensaios clínicos originais, que mostraram uma incidência maior de taquicardia, infarto do miocárdio e aumento da pressão arterial nos grupos que receberam essa combinação de medicamentos do que nos grupos de placebo. Os resultados desse ensaio foram considerados não interpretáveis devido ao manuseio descuidado dos resultados de uma análise interina (1).
Um segundo ensaio, exigido pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) quando a autorização de comercialização europeia foi concedida em 2015, foi suspenso antecipadamente em 2016 (não foram fornecidos mais detalhes). Um terceiro ensaio foi planejado, mas nunca foi iniciado. A EMA rejeitou os protocolos de ensaio propostos subsequentemente pela empresa farmacêutica, chamando-os de inadequados para avaliar esses efeitos adversos. Também rejeitou as medidas propostas pela empresa para mitigar os riscos da combinação de bupropiona + naltrexona em vez desse ensaio, considerando-as insuficientes (1-3).
Em 2021, o efeito adverso “crise hipertensiva” foi adicionado ao resumo europeu das características do produto (European summary of product characteristics, SmPC) para o Mysimba° (2,3). Foi nesse contexto que a Comissão Europeia solicitou à EMA que revisasse a relação de dano-benefício do medicamento (2). Essa análise começou em setembro de 2023, mas, em julho de 2024, a EMA ainda não havia apresentado suas conclusões.
Em resumo: A partir da avaliação inicial (e não surpreendentemente, dada a semelhança química da bupropiona com as anfetaminas), os dados sobre os efeitos adversos da combinação de bupropiona + naltrexona foram alarmantes, dada sua eficácia, na melhor das hipóteses, modesta. Quase 10 anos após sua imprudente autorização de comercialização, já passou da hora de esse medicamento ser retirado do mercado europeu.
Referências